terça-feira, 8 de setembro de 2009

Estrondo, sal e calmaria

Acordei de um cochilo leve quando uma onda empurrou com força a areia fofa de Boiçucanga. Ouvi a espuma se recolhendo e um novo estrondo invadiu o quarto, a quinze metros da praia. Com saudade chacoalhada, enfiei um agasalho e fui sentar debaixo de uma árvore, a tempo de ver a chuva chegando - e os turistas fugindo no final de tarde. Incrível o que o vai e vem dessas águas provoca em mim. Olhos salgados, devo ter chamado a atenção de um rapaz, que não pediu licença para me fazer companhia silenciosa por alguns minutos.

- Você só pode ser caiçara também.
- Oi?
- Moro aqui há 14 anos. Rodrigo. Prazer.
- Oi, Nathalia. Mas por que vc diz isso?
- Porque a gente percebe quem tem essa intimidade com o mar. Também fico com essa cara quando venho aqui pra esvaziar a cabeça. De onde você é?
- Santos.
- Não mora mais lá, não, né?
- Não.
- Tá explicado. Veio recuperar as energias...



Rodrigo tem 28 anos. Construiu com o tio a pousada em que me hospedava. Uma graça, no estilo simples das casinhas dos pescadores. Ele já foi um, aliás. E trabalhou na peixaria ali ao lado também. Quis saber como era a vida em São Paulo, o que eu tinha achado da polêmica do diploma de jornalista (?!). Frequentador da igreja Bola de Neve, é um cara de voz mansa e olhar atento. Tanto que reparou na baita mordida de borrachudo que levei no tornozelo.

- É, os bichos pegam mesmo.
- Nossa, e como coça!
- Entra no mar. Ele cura tudo. Sério: isso aí é moleza.

Cresci com essa história de que não há ferida que o mar não seque. E o remédio milagroso ficava do outro lado da rua da minha casa. Ou emoldurado pela janela da sala. No parapeito dela, inspirada por aquela misteriosa imensidão, me debrucei em sonhos e devaneios. Logo embaixo, na rede ali pendurada, também balancei dores e angústias no ritmo das ondas mais violentas. Até dormir para despertar calmaria. Se a vida estava empatada, era banho de mar para se livrar do mau olhado. Para agradecer uma conquista, mergulho gelado (e inclusive noturno). Caiçara sabe que é quase uma religião mesmo. Lembrei que há muito eu não me abençoava...

O sol ardido veio só no dia seguinte. Não quis perder tempo: convidei minhas feridas para algumas braçadas. Saímos todas cicatrizadas.

4 comentários:

Unknown disse...

Que delícia Nathy.. Tbm fomos para o litoral no feriado, Riviera.. Nada melhor que recarregar as energias com um bom banho de mar, né?
Bjocas

Rach disse...

não sou caiçara, mas aprendi nos poucos anos de praia que o mar cura todas as feridas. e renova todos os pensamentos. e dá um sensação de liberdade, paz, plenitude, calma.
me sinto uma pessoa sufocada sem o mar.
acho uma sacanagem só os caiçaras sentirem isso, pô!

Mazica disse...

sempre venho, nunca comento.. mas falou de mar, nao resisto.. belas palavras, nathy.. bjos

Carla disse...

amar o mar...lindo filha!
te amo ;)